Cap. 22 - Era só uma criança...
No dia 23 de setembro, Sr. Lasloz foi até o abrigo e conversou Labibah. Convenceu-a a ir para sua casa em Budapeste. Assim ele e sua família poderiam ajudar a cuidar das crianças. Também poderiam lidar diretamente com as autoridades responsáveis pelo gerenciamento da crise de refugiados.
Na viagem, Lasloz começou a ouvir as histórias dessas pessoas as quais estava ajudando.
"Sinto-me culpado, em parte, pela situação em que você e as crianças se encontram. A ideia de parar o ônibus partiu de mim.", confessou o homem que lembrava o pai de Labibah. Ela imediatamente corrigiu-o: "Nunca devemos por culpar por fazer a coisa certa." Lasloz agradeceu com um sorriso. Labibah olhava para a paisagem do lado de fora do carro. Os campos de trigo estavam verdes ainda.
"Kadar era um homem perturbado pela culpa quando o conheci, ainda na universidade. Depois que nos casamos, antes de nascerem as crianças, lembro que acordava de pesadelos no meio da madrugada. Então ele chorava muito. Passados alguns dias, tudo se repetia. Era um adulto que vivia sentindo-se indigno de coisas boas. Não conseguia desfrutar de um passeio, por exemplo. Em algum momento sempre uma melancolia invadia sua alma e era como uma sombra que 'escurecia' qualquer ambiente alegre. Quando ele era criança, feriu um amigo com uma arma de fogo. Foi numa tarde de verão. Os meninos estavam brincando na rua e ele os olhava pela janela. Como era muito tímido, só descia para brincar quando os meninos o buscavam na porta de casa. Naquela ocasião não o tinham chamado. Mas a vontade de descer era muito grande. Então, ele percebeu que os meninos mudaram a brincadeira e passaram a imitar soldados. Escondiam-se e 'atiravam' com suas armas imaginárias. Imediatamente lembrou da arma de seu pai. Ele vira a arma, uns dias antes, num pequeno baú de madeira, de baixo da cama dos pais. Num impulso pegou a arma sem que os adultos da casa percebessem e desceu para brincar com os meninos. Pensou que estava levando um brinquedo muito interessante e que, por isso, iam aceitá-lo na brincadeira. E ele estava certo! Os meninos ficaram entusiasmados com a arma. Zamir, com os olhos arregalados, perguntou: 'É de verdade, Kadar?'. 'Sim, claro. É do meu pai'. 'Deixa eu ver!', pediu, mas já foi tomando a arma das mãos do amigo. Kadar a segurou firme. Queria brincar um pouco antes de emprestá-la para alguém. Nesse 'puxa-puxa' dos meninos, a arma disparou. Zamir perdeu o olho direito naquele acidente. Tentando compensar a família do menino, o pai de Kadar entregou grande quantia em dinheiro, mas este ameaçava a família seguidamente. Além disso, outras pessoas da própria família de Kadar começaram a criticá-lo. Nem deixavam mais ele chegar perto dos primos. Por fim, acabaram mudando de cidade. E meu marido não conseguia livrar-se dessa culpa."
Lasloz acompanhava a história com muita atenção. "Mas ele era só uma criança..."
"Sim. Justamente por isso passou a acreditar que seria um homem mau. Que tinha tendência para fazer o mal a outras pessoas. Então nos conhecemos. Lembro do dia que me contou essa história. Estávamos com o casamento marcado. Ele estava convencido de que, no final, eu terminaria o noivado. Surpreso com minha compreensão, disse que eu era a única coisa boa que ele estava aceitando receber desde que tudo aconteceu."
Na viagem, Lasloz começou a ouvir as histórias dessas pessoas as quais estava ajudando.
"Sinto-me culpado, em parte, pela situação em que você e as crianças se encontram. A ideia de parar o ônibus partiu de mim.", confessou o homem que lembrava o pai de Labibah. Ela imediatamente corrigiu-o: "Nunca devemos por culpar por fazer a coisa certa." Lasloz agradeceu com um sorriso. Labibah olhava para a paisagem do lado de fora do carro. Os campos de trigo estavam verdes ainda.
"Kadar era um homem perturbado pela culpa quando o conheci, ainda na universidade. Depois que nos casamos, antes de nascerem as crianças, lembro que acordava de pesadelos no meio da madrugada. Então ele chorava muito. Passados alguns dias, tudo se repetia. Era um adulto que vivia sentindo-se indigno de coisas boas. Não conseguia desfrutar de um passeio, por exemplo. Em algum momento sempre uma melancolia invadia sua alma e era como uma sombra que 'escurecia' qualquer ambiente alegre. Quando ele era criança, feriu um amigo com uma arma de fogo. Foi numa tarde de verão. Os meninos estavam brincando na rua e ele os olhava pela janela. Como era muito tímido, só descia para brincar quando os meninos o buscavam na porta de casa. Naquela ocasião não o tinham chamado. Mas a vontade de descer era muito grande. Então, ele percebeu que os meninos mudaram a brincadeira e passaram a imitar soldados. Escondiam-se e 'atiravam' com suas armas imaginárias. Imediatamente lembrou da arma de seu pai. Ele vira a arma, uns dias antes, num pequeno baú de madeira, de baixo da cama dos pais. Num impulso pegou a arma sem que os adultos da casa percebessem e desceu para brincar com os meninos. Pensou que estava levando um brinquedo muito interessante e que, por isso, iam aceitá-lo na brincadeira. E ele estava certo! Os meninos ficaram entusiasmados com a arma. Zamir, com os olhos arregalados, perguntou: 'É de verdade, Kadar?'. 'Sim, claro. É do meu pai'. 'Deixa eu ver!', pediu, mas já foi tomando a arma das mãos do amigo. Kadar a segurou firme. Queria brincar um pouco antes de emprestá-la para alguém. Nesse 'puxa-puxa' dos meninos, a arma disparou. Zamir perdeu o olho direito naquele acidente. Tentando compensar a família do menino, o pai de Kadar entregou grande quantia em dinheiro, mas este ameaçava a família seguidamente. Além disso, outras pessoas da própria família de Kadar começaram a criticá-lo. Nem deixavam mais ele chegar perto dos primos. Por fim, acabaram mudando de cidade. E meu marido não conseguia livrar-se dessa culpa."
Lasloz acompanhava a história com muita atenção. "Mas ele era só uma criança..."
"Sim. Justamente por isso passou a acreditar que seria um homem mau. Que tinha tendência para fazer o mal a outras pessoas. Então nos conhecemos. Lembro do dia que me contou essa história. Estávamos com o casamento marcado. Ele estava convencido de que, no final, eu terminaria o noivado. Surpreso com minha compreensão, disse que eu era a única coisa boa que ele estava aceitando receber desde que tudo aconteceu."
Lazlo leva a família em sua companhia para Budapest, e no caminho Lalivah faz revelações sobre a vida de Kadar, sobre um fato ocorrido na infância deste que o fazia carregar um sentimento de culpa.
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