Cap. 33 - Daniyal
Fui eu quem deu a ideia para minha mãe escrever um blog. Então ela começou a contar detalhadamente episódios do que nos havia acontecido. Muitas situações ela me perguntava como tinha sido, para se certificar que sua memória estava clara a respeito. Também queria saber o que foi que eu pensei naquele momento. Se tive medo. Se entendi o que aconteceu. Sentado ao seu lado, em frente ao computador, nossas conversas pareciam não ter fim e nos aproximaram muito nas primeiras semanas em Frankfurt.
Com o tempo comecei a escrever também. Meu ponto de vista de nossa história.
Tudo o que passamos não foi a história mais triste. Outras famílias perderam suas vidas na travessia do mar. Outras adoeceram e morreram em algum ponto da travessia. Outras famílias apenas uma parte conseguiu chegar ao destino. Muitas ficaram presas numa burocracia sem fim em acampamentos precários, desumanos. Qualquer uma dessas coisas poderia ter acontecido conosco.
Cresci recontando nossa história. Não para atrair a atenção das pessoas para nossa situação. O objetivo sempre foi fazer convergir a compaixão numa grande rede de solidariedade. Em favor do refugiados do mundo.
Depois vieram outras histórias para contar. De outras pessoas. Histórias que atravessavam o mar como nós. Algumas vindas da Síria, outras da África, outras do Sudão do Sul, do Afeganistão, Iraque, Chechênia. As pessoas narravam suas vidas para mim e eu narrava no blog para que outros as conhecessem. Seria injusto deixar cair no esquecimento o que elas viveram, em seus países de origem e em suas jornadas até a Europa. Penso que não deixar essas histórias se perderem é garantir que suas vidas não se percam.
Cada uma dessas histórias é única. Existem histórias em comum. Vivências do mesmo tipo, mas nunca iguais. Alguns dizem que quando se chega ao destino final na Europa, é hora de deixar tudo para trás. No entanto, nosso esforço tem sido que cada pessoa se aproprie de sua história e não a rejeite. Foi essa história que nos trouxe até aqui. E ela que nos faz prosseguir.
O escritório onde trabalho hoje é grande, mas tudo começou no interior de nosso novo apartamento em Frankfut. Minha mãe sentada, o notebook aberto sobre nossa mesa de jantar e nossa história sendo reescrita. Nos primeiros tempos nossa família preocupava-se com os sírios e a travessia pela Europa. Com tempo fomos ampliando o alcance das ações da ONG para outros grupos de refugiados. E depois passamos a gerir diversas ações, contando com iniciativas de outras ONGs, locais, nacionais e internacionais. Cada crise humanitária pede uma configuração específica e temos nos empenhado muito para não deixar essas pessoas em deslocamento sem algum tipo de apoio.
No escritório temos muitas pessoas envolvidas, trabalhando. E de certa forma, nossas vidas se entrelaçam. Como a minha e de Maritza, minha esposa.
De origem Afegã, Maritza foi encontrada sozinha num acampamento na cidade de Calais, na França. Tinha três anos de idade. Até hoje não sabemos o que aconteceu com sua família.
Nós dois nos conhecemos muito depois desse acontecimento, a cinco anos atrás. Certa tarde, uma linda jovem entrou no escritório dizendo que queria que sua história fosse contada. Ainda estou escrevendo. E ela a minha. E agora a nossa: daqui a três meses nasce nossa primeira filha. Ela receberá o nome de Esperanza.
Com o tempo comecei a escrever também. Meu ponto de vista de nossa história.
Tudo o que passamos não foi a história mais triste. Outras famílias perderam suas vidas na travessia do mar. Outras adoeceram e morreram em algum ponto da travessia. Outras famílias apenas uma parte conseguiu chegar ao destino. Muitas ficaram presas numa burocracia sem fim em acampamentos precários, desumanos. Qualquer uma dessas coisas poderia ter acontecido conosco.
Cresci recontando nossa história. Não para atrair a atenção das pessoas para nossa situação. O objetivo sempre foi fazer convergir a compaixão numa grande rede de solidariedade. Em favor do refugiados do mundo.
Depois vieram outras histórias para contar. De outras pessoas. Histórias que atravessavam o mar como nós. Algumas vindas da Síria, outras da África, outras do Sudão do Sul, do Afeganistão, Iraque, Chechênia. As pessoas narravam suas vidas para mim e eu narrava no blog para que outros as conhecessem. Seria injusto deixar cair no esquecimento o que elas viveram, em seus países de origem e em suas jornadas até a Europa. Penso que não deixar essas histórias se perderem é garantir que suas vidas não se percam.
Cada uma dessas histórias é única. Existem histórias em comum. Vivências do mesmo tipo, mas nunca iguais. Alguns dizem que quando se chega ao destino final na Europa, é hora de deixar tudo para trás. No entanto, nosso esforço tem sido que cada pessoa se aproprie de sua história e não a rejeite. Foi essa história que nos trouxe até aqui. E ela que nos faz prosseguir.
O escritório onde trabalho hoje é grande, mas tudo começou no interior de nosso novo apartamento em Frankfut. Minha mãe sentada, o notebook aberto sobre nossa mesa de jantar e nossa história sendo reescrita. Nos primeiros tempos nossa família preocupava-se com os sírios e a travessia pela Europa. Com tempo fomos ampliando o alcance das ações da ONG para outros grupos de refugiados. E depois passamos a gerir diversas ações, contando com iniciativas de outras ONGs, locais, nacionais e internacionais. Cada crise humanitária pede uma configuração específica e temos nos empenhado muito para não deixar essas pessoas em deslocamento sem algum tipo de apoio.
No escritório temos muitas pessoas envolvidas, trabalhando. E de certa forma, nossas vidas se entrelaçam. Como a minha e de Maritza, minha esposa.
De origem Afegã, Maritza foi encontrada sozinha num acampamento na cidade de Calais, na França. Tinha três anos de idade. Até hoje não sabemos o que aconteceu com sua família.
Nós dois nos conhecemos muito depois desse acontecimento, a cinco anos atrás. Certa tarde, uma linda jovem entrou no escritório dizendo que queria que sua história fosse contada. Ainda estou escrevendo. E ela a minha. E agora a nossa: daqui a três meses nasce nossa primeira filha. Ela receberá o nome de Esperanza.
Nesse capítulo Daniyal descreve o surgimento do Blog, idealizado por ele e sua mãe, para contar a história dos refugiados de vários países. Do Blog surgiu a ONG que ajuda refugiados. Também descobrimos que Daniyal é casado e em breve vai ser pai.
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